Crônicas
Os fantasmas que não vestem fantasia
2022-08-22 08:33:31

Wilson Márcio Depes

Li uma crônica muito interessante sobre o carnaval, de autoria do Arnaldo Bloch, publicada em O Globo. Diz ele que uma das graças do carnaval é a sua maleável onipresença. Como assim? Cada um faz a festa como bem entender, inclusive negá-la, mas o Momo estará sempre à espreita, da luz às cinzas. Será mesmo que preciso explicar melhor? Mesmo que você passe em casa os quatro dias, avistará, pela janela, os cortejos. Ao deitar, diz ele com toda razão, o sono será alertado ou embalado por batucadas ou batidões, velhas ou novas marchas, muito samba, muito choros e roquenrol. Por mais longínqua que seja a cabana chegará lá algum eco nem que seja numa tevê à pilha. No meu caso especial - absolutamente nada contra o carnaval – fui contemplado com um festival de música sertaneja que durou 12h sem descanso. Às quatro da manhã o velho mineiro cansou e debruçou-se na calçada, depois do último gole. Carnaval onipresente. Na selva, lembra o cronista, se a suçuarana der aviso de presença, o bafo da onça, mesmo no ápice do medo, terá o perfume de um antigo refrão. Afinal, a conclusão é a seguinte: ou o sujeito se entrega ao fausto, ou vai ter que se entender com os próprios fantasmas, daqueles que não vestem fantasia. Virão à mente os salões cheios dos bailes seja do Iate Clube de Marataízes, do Caçadores, dos salões do Ita, do Cruzador. Lembrei-me agora do clube Leopoldina, de Minas Gerais, terra de minha mãe. O clube de Leopoldina, nas minhas fantasias, era o próprio Monte Líbano. Me arrumava todo para ir pular as quatro noites. Queira ou não, Arnaldo, rendo-me ao conceito de que o carnaval é assim. O coração de pedra, em algum momento, é infiltrado por aquela gota mole que tanto bate. E, quer saber, bate mesmo, com força e muitas saudades. São indelevelmente os fantasmas que não vestem fantasia.

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