Wilson Márcio Depes
Na luta contra a ditadura, Ulisses Guimarães vociferava: deixem o povo votar. Ainda que erre, acabará acertando. Mais importante do que dar o peixe, é ensinar a pescar, diz o provérbio chinês. Pela receita não se sabe o gosto do pudim. É preciso prová-lo. Isso dizia o “senhor das diretas, já”. Depois da Lava Jato, que pretendeu passar o país a limpo, por mais que se possa lastimar a falta de um candidato adequado às pretensões do eleitor, não há motivo para ser pessimista ou reclamar tanto. Contrariando a opinião geral, acredito que há candidatos, sim. Existem candidatos bons, maus, insossos, sem ideologia, corruptos, mas há também candidatos preparados e competentes. Assim também – e me permitam a comparação – julgadores no mesmo patamar. Com o protagonismo do Poder Judiciário, você pode assistir diariamente a um homem médio traçar críticas acerbas aos ministros do Supremo Tribunal Federal, chamando-os pelo nome. E olha que neste ponto, cabe lembrar o papel do Supremo Tribunal Federal, que é de interpretar e dar plena aplicabilidade à Constituição, zelando sempre pela total harmonia entre os poderes da República, no caminho da unidade e do desenvolvimento social, a partir da realização do direito. Há pouco tempos, pouca gente conhecia o ministro aposentado, Carlos Ayres Britto, hoje, porém, já se escala os 11 ministros com facilidade. Melhor até que a seleção. Conta a literatura que dois personagens de Boris Pasternak, dois homens de gerações diferentes, conversavam em uma casa de chá, em Moscou, por volta de 1917. Um deles diz que o outro é jovem demais para analisar com correção determinado tema. O mais jovem responde que não tem razão nenhuma para acreditar que a idade aperfeiçoa os seres humanos. O mais velho replica que com a idade as pessoas se tornam mais tolerantes. O mais jovem contesta que isso é certamente porque vão tendo, cada vez mais, o que tolerar em si mesmas. Não sei o episódio pode se aplicar ao momento eleitoral que estamos atravessando, mas posso lhes dizer que, com paciência ou não, vivemos um lado positivo de nossa realidade. Os eleitores, dentro das limitações de cada um, estão se tornando, em alguns casos, mais exigentes. Ouvi de um amigo esses dias que “sei que vou perder meu voto, mas vou votar no candidato que pensa como eu, que propõe tudo que penso que seja certo”. Mesmo depois da Lava Jato, longe de assistir ao enfrentamento decisivo – ou não – entre o colono que quer um país de verdade, um país que respeita suas próprias leis e os sonhos de seus cidadãos, e a volúpia do colonizador, que é exposta como nunca na atitude dos corruptos ativos e passivos. O enfrentamento entre colono e colonizador é sempre um teatro. Aprendi, como a vida, que o pessimista sofre duas vezes, antes e depois do acontecimento. Enquanto o otimista, uma vez só, quando perde. E, por isso, como dizia Ulisses, que nunca conseguiu realizar seu sonho de ser presidente da República, “deixe o povo votar”. Otávio Frias Filho, recentemente falecido, excluiu a coluna que Drummond escrevia na Folha porque achava o texto chato. Mandou o poeta embora do jornal. Mas o poeta, a pretexto de eleição, repetiu Ulisses Guimarães: “uma eleição é feita para corrigir o erro do pleito anterior, mesmo que o agrave”.
Artigo Século Diário online - Publicado em 29/08/2018