Wilson Márcio Depes
Gosto de certas raridades que, afinal, dão um toque de beleza à vida. Vira e mexe estou lembrando delas. Principalmente em dias em que a saudade atinge este coração já um pouco castigado pelo tempo. Lembro de minha mãe, Dona Lívia, ensinando os primeiros versos à minha irmã Maria Emília: “Hoje é domingo/ pé de cachimbo/ o cachimbo é de barro/ que bate no jarro/ o jarro é de ouro/ que bate no touro/ o touro é valente/ e bate na gente/ a gente é fraco/ que cai no buraco/ o buraco é fundo/ que arrasa o mundo”. Quando ela tropeçava numa palavra ou letra, eu já corrigia. Ela, por sua vez, morria de rir. Dizia, se bem me lembro, “este menino é ladino”. Ficava vendo os olhos da minha mãe ficarem cada vez menores à medida em que ela ia rindo e eles – olhos – ficavam molhados com pequenas lágrimas da alegria. Tinha, no máximo, três anos de idade. Lembrei disso porque minha mãe dizia que desde muito cedo eu tinha mania de dicionário. Hoje, claro, continuo com a mesma mania, mas meus colegas de escritório riem muito, pois eles possuem um professor excelente, o Dr. Google, sendo desnecessário, portanto, o dicionário físico. Só que o Dr. Google não conhece os sinônimos que muito me ajudam na petição. Confesso, cometia – acho que ainda o faço – o erro de repetir palavras num texto. Nunca tentei saber o porquê. E os sinônimos quebram um galho danado. Além do dicionário propriamente dito, tenho o meu só de sinônimos, aliás, dicionário que só eu uso. Certa feita fiquei muito intrigado com uma observação do então Governador do Rio de Janeiro (naquela época era Guanabara), Carlos Lacerda. Ele disse, no meio de uma crônica, que, assim como existem ponto de exclamação e ponto de interrogação, deveriam haver ponto de ironia. Se as frases exclamativas e interrogativas têm um sinal para identificá-las, as frases irônicas também precisariam desse sinal. Teve o insight, mas não disse como seria esse sinal. Contei essa curiosidade ao Ziraldo e, rápido no raciocínio, disse logo. “Já sei. É um ponto de exclamação com um pingo em cima.”. Nunca me convenci disso. De todas as curiosidades, prefiro me lembrar das cantigas de minha mãe, como hoje estou fazendo. O dia fica mais leve nessa turbulência toda.