Vou tratar hoje de um assunto de Direito, mas que envolve uma interpretação muito curiosa. Uma mãe viúva e seus cinco filhos foram impedidos de usar área comum do edifício onde moram porque estavam inadimplentes com as contribuições relativas ao condomínio. A senhora vinha atravessando dificuldades financeiras, com problemas de saúde na família, e foi, brutalmente, impedida de fruir dos espaços do condomínio. Achei muito estranho isso, sob o ponto de vista humano e jurídico. Pois bem. A senhora ingressou na Justiça. O Ministro do STJ, Luís Felipe Salomão, decidiu que a privação imposta pelo condomínio era ofensiva à dignidade humana, já que a dívida estava garantida pelos bens da viúva. E não houve qualquer impedimento para cobrá-la. A imprensa caiu de pau em cima do Ministro. Veja que absurdo. Além de ser uma ofensa à dignidade daquela família, também porque não existe na lei civil qualquer restrição contida no regulamento do edifício. A decisão do Ministro, queira ou não quem não concorda, privilegia as garantias individuais consagradas na Constituição Federal. Ora, aqui pra nós, não pode haver penalidade onde a lei não prevê. Parte da imprensa que criticou a decisão, parece desconhecer os mais elementares direitos da dignidade humana. Tempos estranhos esses... Digo mais: O art. 1335, do Código Civil, prevê direitos dos condôminos, e não impõe qualquer condição à utilização de sua parte na propriedade comum, nem muito menos exige pagamento prévio dos valores em atraso para tanto. Esclarece o Ministro, e o faz com justeza, que “a forma de cobrança da dívida condominial está prevista na lei, sendo bastante rigorosa (multa, juros, correção monetária, podendo o devedor perder o próprio imóvel para saldar o débito).” Que essa lição e essa notável jurisprudência possa servir de lição àqueles que continuam achando que vivemos num Brasil-Colônia. Ou vivemos?