Um passado de muitas lutas
2022-08-22 16:03:06
Wilson Márcio Depes
Recebo pergunta de um leitor, bem discreto, mas que pretende entender o que se passa no país, na qual indaga qual a diferença, na linguagem jurídica, entre “garantistas” e “punitivistas”. Tal assunto, por óbvio, nasceu do confronto entre alguns ministros do Supremo Tribunal Federal e o Ministério Público Federal. Mas, por favor, lanço explicações simples só para não perder um único leitor que tenho. Os “garantistas” são conhecidos por defender a aplicação estrita da letra da lei, sem condenações a qualquer custo. Porém, os “punitivistas” parecem estar à frente do inquérito. O que é, para mim “garantista”, quase um ultraje. O que mais me preocupa é o fato de a Associação dos Procuradores da República, em decorrência de fatos da Lava-Jato, levar a Procuradora Raquel Dodge a dizer que o “Supremo se tornou um tribunal de exceção”. Não sabe, por certo, o que é um tribunal de exceção, pelo visto. Temos uma Constituição que dispõe, claramente, no inciso XXXVII, do art. 5º que “não haverá juízo ou tribunal de exceção". Em contraposição ao tribunal de exceção, tem-se o princípio do juiz natural, que dispõe acerca da necessária imparcialidade do magistrado ao aplicar as normas do ordenamento jurídico ao caso concreto, decidindo de modo razoável e proporcional, zelando pela proteção dos direitos e garantias fundamentais de toda sociedade. Há uma velha história que conta que, nesses casos, pretende-se compatibilizar intenções democráticas com marginalização antidemocrática. É a mágica impossível do sorvete quente, referida por João Mangabeira durante o Estado Novo. A criança resfriada chorava e berrava pedindo sorvete. A mãe, desesperada, imaginou a coexistência do sorvete e da gripe e varejou a cidade em busca de “sorvete quente”. Por isso, não tem razão a Procuradora, porque o Supremo não é um tribunal de exceção. Há direito de errar que nos mantêm forte como Nação. Temos uma Constituição, como dizia Ulisses Guimarães, em que o povo foi o fundador, por votação direta, do governo e da lei, não podemos esquecer disso num momento tão delicado no qual se dizem palavras ao vento, sem qualquer responsabilidade, esquecendo um passado de muitas lutas.